Vizinhas de hotel são tiradas de barracos para visita de Bush

Moradores das proximidades do hotel onde o presidente vai ficar são tirados de barracos; vendedores ambulantes também foram impedidos de trabalhar na região

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Por Agencia Estado
Atualização:

Duas Marias, uma Cruz e outra Rodrigues, foram desalojadas na quarta-feira, 7, dos barracos onde moravam há 15 anos, na calçada da Rua John Baird, por causa da visita do presidente George W. Bush à cidade. A via, sem saída, tem uma entrada para o estacionamento do Hotel Hilton, que hospedará o presidente e a primeira-dama Laura Bush, na região da Avenida Luís Carlos Berrini, zona sul de São Paulo. No local, agora, há apenas o muro, que foi pintado em cinza. As moradias eram irregulares, reconhecem, mas ambas foram despejadas da noite para o dia, com as suas famílias, os pertences e um gato preto de estimação. ?Perguntei para a assistente social se era por causa da visita do homem (Bush) e ele me respondeu: também?, contou Maria Rodrigues, de 39 anos, que morava no local com dois filhos. ?Faz tempo que eles retiram e nós reconstruímos. Há um ano nos prometeram uma casa, mas não saiu. Pelo menos a minha barraca de cachorro-quente eu vou montar de novo depois que ele for embora. Preciso ganhar a vida.? Na quarta-feira, dormiria na casa de uma irmã. A ex-vizinha, Maria da Cruz, de 51 anos, que vive com o marido, dois filhos e o gato, passaria a noite em vigília, pois não queria abandonar os pertences deixados pelas duas famílias no estacionamento da rua. Gentileza dos vizinhos. Por volta das 20 horas, as duas Marias reuniram os familiares para lanchar: pão e guaraná. Sentadas na calçada, pensavam no que fazer. ?Só Deus sabe?, diziam. Segundo o subprefeito de Pinheiros, Nilton Nachle, os dois barracos estavam em situação irregular, erguidos sobre a calçada, e seriam retirados mais cedo ou mais tarde. ?Mas é preciso colaborar com a segurança da visita do presidente.? Indagado se havia sido oferecido abrigo em albergue municipal para as famílias, ele confirmou. ?Eles não aceitaram.? As mulheres contestam. ?Ofereceram albergue há um ano, mas hoje não. Queremos um canto para morar.? Consultada à noite pela reportagem, a assessoria de imprensa da subprefeitura reafirmou a oferta de abrigo em um albergue. Na Rua Lee de Forester, vizinha à Rua John Baird, os moradores foram alertados de que não poderiam trabalhar durante a visita de Bush. São catadores de recicláveis e sucata, ambulantes que vendem lanches àqueles que trabalham nos modernos prédios da vizinhança daquela rua, asfaltada só pela metade. Um ferro-velho funciona ali, num terreno alugado, com movimento intenso de catadores. No local, vendem tudo o que coletaram durante o dia. Os trabalhadores informais foram orientados pela prefeitura a manter o portão sempre fechado e os carrinhos dos catadores não poderão ficar na rua, sob pena de apreensão. Os homens preferiram não se identificar, por medo de represálias, mas queriam saber quem pagaria pelos três dias parados. É a mesma preocupação de Ruth dos Santos Madalena, de 36 anos, que mora na Rua Lee de Forester e tem um ponto com sua Kombi de cachorro-quente, na esquina da Rua John Baird, há cinco anos. Foi orientada a não trabalhar de quarta até o sábado, dia tradicionalmente sem movimento. Apesar de tudo, Ruth e os amigos não pareciam estar aborrecidos com o presidente americano. Sabem que a ação, mesmo sendo para a segurança do chefe de Estado, foi decidida pelas autoridades brasileiras. Na pequena casa de Ruth, depois do jantar, a família preparava um cartaz. ?Presidente Bush, muito obrigado pela visita. Nosso País está nos impedindo de trabalhar. Quem vai pagar nossas contas??

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