Herdeiro político do pai, Dr. Jairinho tem votos em região de milícia e foi líder de Paes e Crivella

Jairo Souza Santos Júnior foi preso na manhã desta quinta-feira, 8, no âmbito do inquérito que investiga morte de seu enteado Henry Borel Medeiros, de 4 anos

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Por Caio Sartori e Wilson Tosta
3 min de leitura

RIO - Três dias após a divulgação da morte suspeita do menino Henry Borel, de 4 anos, seu padrasto, o vereador Jairo Souza Santos Júnior (Solidariedade), mais conhecido como Dr. Jairinho, foi empossado para o Conselho de Ética da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. A posse em 11 de março, no início das investigações sobre o episódio chocante e sob apuração policial, ilustra a força do político.

O médico de 43 anos tem no nome de urna um sinal da linhagem que o elegeu. Seu pai é o suplente de deputado estadual Coronel Jairo, um PM da reserva que foi parlamentar de 2003 a 2018. O ex-deputado foi citado na CPI das Milíciasda Alerj como supostamente ligado à Liga da Justiça. Dez anos depois, passou pela cadeia, levado pela Operação Furna da Onça. Jairo, o Velho, repudia as acusações e nega ter cometido crimes.

Dr Jairinho está em seu quinto mandato como vereador. Começou em 2004, aos 27 anos,pelo PSC, no figurino de homem público banalizado no Rio nas últimas décadas, quando se tornaram comuns no  Estadoas carreiras politicas impulsionadas por laços de família. Jairo, o Moço, elegeu-se na mesma base do pai deputado, com centro em Bangu, Realengo, Padre Miguel, na zona oeste da capital fluminense. Desde então, não perdeu nenhuma eleição para a Câmara. Disputou mais dois pleitos -em 2008 e 2012   - , pelo mesmo PSC. Depois, concorreu pelo MDB e obteve o último mandato pelo Solidariedade, que anunciou agora examinar sua “expulsão sumária”.

Em 2020, Dr.  Jairinho foi o vigésimo-oitavo mais votado para o Legislativo carioca, com 16.061 votos. Sem muita nitidez ideológica e com CRM ativo desde julho de 2004, foi líder dos governos (passado) de Eduardo Paes  (DEM) e de Marcelo Crivella (Republicanos).

Ainda estava na liderança de Crivella na Câmaraquando, no segundo turno da eleição do ano passado, participou de um evento de apoio a Paes. Quase literalmente, “jogou” em casa, no Ginásio Jairo Souza Santos, batizado com o nome do pai, no Ceres Futebol Clube. É uma pequena agremiação suburbana, que  Coronel Jairo preside e que Jairinho frequentou desde a juventude. Ali pediu que votassem no hoje prefeito.

 Àquela altura, a eleição para a prefeitura do Rio era, para os políticos mais experientes da cidade, “jogo jogado”. Pesquisas davam grande vantagem ao demista. O vereador rapidamente voltou ao velho aliado, que o aceitou sem restrições. Afinal, a proximidade do poder lhe garante a presença em inaugurações da prefeitura, que rendem votos. Como ocorreu no Bairro Maravilha Oeste, no IAPI de Padre Miguel, em 25 de outubro de 2016, registrada no YouTube. Na gravação,  Dr. Jairinho aparece sorridente, falando ao microfone.

“Quando eu vejo a galera andando de skate aqui nestas ruas, quando eu vejo as crianças aqui participando, e o bairro se sentindo valorizado, as pessoas gostando de estar morando (sic) aqui, eu fico mais feliz”, discursou Jairinho, ao lado do então secretário-executivo de Coordenação de Governo, Pedro Paulo Carvalho. Na produção, há imagens de crianças brincando em uma pracinha,  e Pedro Paulo, o político mais ligado a Eduardo Paes, parece, algumas vezes, desconfortável.

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Na mesma região onde Dr. Jairinho e o pai colhem votos, milicianos atuam. No Jardim Batam, em Realengo, em 2008, uma equipe do jornal O Dia, que se infiltrara na comunidade para fazer uma reportagem sobre a milícia, foi capturada pelos criminosos. Os três profissionais foram torturados, ameaçados de morte e posteriormente perseguidos pelos bandidos. Investigações da Polícia Civil não conseguiram provas de envolvimento de políticos da região nesses crimes.

Dr. Jairinho tinha cargos importantes na Câmara

Em seus dezesseis anos na Câmara,Dr. Jairinho ocupou postos de destaque, além das lideranças dos governos Paes e Crivella. Foi presidente de Comissão de Educação, vice da Comissão de Saúde, presidente da Comissão Especial do Plano Diretor do Município. Também foi primeiro-secretário da instituição.

Pessoalmente, destaca-se pelos cuidados pessoais. Veste ternos bem cortados e de excelente qualidade e dá especial atenção ao cabelo, que penteia com frequência, e mantém a barba aparada. Polido e contido, não passa emoções a seus interlocutores. Alguns colegas, reservadamente, preferem manter distância  do político da zona oeste.

Nas últimas semanas, depois da morte de Henry, surgiram contra o vereador denúncias de supostos atos de violência. Ex-namoradas denunciaram agressões e ameaças, contra si mesmas e contra crianças. A defesa do político rebateu as acusações. Em petição à 16ª DP (Barra da Tijuca), chegou a falar que  uma ex-namorada queria se vingar de Dr. Jairinho e o atacava com “calúnias”. Os depoimentos com supostas agressões contra menores de idade, porém, geraram investigações na Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (DCAV). Também lá o vereador, agora preso, terá de se explicar.

Correções

Uma versão anterior desta reportagem informava erroneamente que Jairinho tinha sido o 16º vereador mais votado. O dado correto é que ele foi o 28º mais votado. A reportagem foi corrigida.

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