Professores de colégio católico do Rio são denunciados por assédio sexual

Os dois professores teriam cometido os supostos crimes a partir de 2016; alunas tinham, em média, 16 anos

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Por Fabio Grellet
Atualização:

RIO - Dois professores do Colégio Santo Inácio, uma das escolas mais tradicionais do Rio de Janeiro, foram denunciados pelo Ministério Público do Rio (MP-RJ) por assédio sexual cometido contra alunas do colégio, que tinham, em média 16 anos, segundo o MP-RJ. Os supostos crimes foram praticados a partir de 2016, e a denúncia foi apresentada à 26ª Vara Criminal do Rio em março. 

O advogado dos dois afirmou que ainda não fez um estudo minucioso dos autos e por isso prefere não se manifestar. Questionado pela reportagem sobre providências a respeito dos dois professores, o colégio informou que segue "com a postura de não expor pessoas que fazem ou fizeram parte da nossa comunidade escolar”. O Santo Inácio é um colégio particular católico situado em Botafogo, na zona sul, que oferece Ensino Fundamental 1 e 2 e Ensino Médio, além de Educação de Jovens e Adultos e Educação Profissional.

Direção do colégio é acusada de não ter tomado providências ao receber denúncias de assédio sexual supostamente praticado por professores contra alunas Foto: Wilton Junior/Estadão - 3/8/2020

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Os dois professores foram denunciados à direção do colégio em 2018, segundo a advogada Maria Eduarda Pessoa de Assis. Ela integra o coletivo Inaiá, que reúne alunos e ex-alunos (como ela, formada em 2012) dispostos a acolher vítimas de assédio e cobrar da escola a adoção de medidas para que os casos não se repitam.

“Uma aluna que estava no último ano e era vítima de assédio colheu testemunhas de outras colegas também assediadas e levou todos os casos à direção da escola, que, em vez de acolher e investigar, disse que a aluna poderia ser processada por calúnia”, conta Maria Eduarda. 

Intimidada, a aluna chegou a se afastar do colégio e a mãe dela cobrou a escola. “Mas, para a mãe, a escola narrou uma história diferente, amenizando a conduta dos professores. Sob pressão, a aluna não teve forças para confirmar à mãe o que havia acontecido. Como a estudante iria se formar em seguida, a história acabou esquecida”, diz Maria Eduarda.

A escola não tomou providências - pelo contrário: segundo Maria Eduarda, teria emitido naquele ano um elogio a um dos professores acusados - e a família da estudante não denunciou o caso fora do colégio.

A história voltou a ser debatida em junho de 2020, depois que a revista Veja divulgou a acusação de assédio. Pelas redes sociais, várias outras alunas e ex-alunas relataram episódios semelhantes e iniciaram um movimento para cobrar medidas da direção da escola. Segundo Maria Eduarda, os episódios narrados envolvem condutas como tocar o sutiã de uma aluna e acordar com um beijo outra estudante, que dormia na carteira.

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O Ministério Público e a Polícia Civil tomaram conhecimento das denúncias e uma investigação começou a ser feita pela 10ª DP (Botafogo). Em 12 de junho, o colégio enviou mensagem aos pais de alunos informando o “afastamento das pessoas acusadas para que tenham direito de plena defesa”. A escola não divulgou nomes, mas, segundo alunos, as acusações são direcionadas a dois professores.

A investigação teve resultado em duas esferas. No âmbito cível, convencido de irregularidades cometidas pelo colégio, o MP-RJ tentou firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a escola, que se obrigaria a tomar providências como o afastamento da diretora acadêmica Ana Maria Bastos Loureiro e do coordenador de Ensino Médio, Marcos Vinicius Borges da Silva Machado, acusados de não terem tomado as providências necessárias diante das denúncias. 

O colégio não aceitou a lista de providências exigidas, segundo o MP-RJ, e se recusou a firmar o TAC. Como consequência, na última segunda-feira, 14, a 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Infância e da Juventude e a 3ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Proteção à Educação da capital ajuizaram ação civil pública contra o colégio e os dois funcionários.

O MP-RJ requer à Justiça o afastamento dos dois profissionais, a adoção de medidas administrativas e pedagógicas e a condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos materiais e morais, além de aplicação de  multas. Os valores não foram sugeridos - ficarão a cargo da Justiça, caso o processo seja julgado procedente.

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No âmbito criminal, a 10ª DP indiciou os dois professores por assédio sexual, crime previsto pelo art. 316 do Código Penal: “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. Se a vítima for menor de 18 anos, a pena é de até dois anos e oito meses de prisão.

Em 16 de março, a 1ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal (Botafogo e Copacabana) ofereceu denúncia contra os dois professores, e o caso foi distribuído à 26ª Vara Criminal. A juíza Ana Helena Mota Lima Valle ainda não divulgou se aceita ou não a denúncia - caso aceite, os dois professores vão se tornar réus no processo, que tramita em segredo de Justiça.

Colégio diz que segue valor de não expor pessoas da comunidade escolar

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Questionado pela reportagem se os dois professores foram demitidos, o Colégio Santo Inácio afirmou em nota que segue “com a postura que está plenamente alinhada com nossos valores de não expor pessoas que fazem ou fizeram parte da nossa comunidade escolar”. Segundo alunos do colégio, os dois professores não voltaram a dar aulas.

O advogado Ruyz Athayde Alcantara de Carvalho Filho, que defende os dois professores, afirmou na noite desta quinta-feira que, embora já tenha tido acesso aos autos, não teve tempo de fazer um estudo minucioso da denúncia, e por isso não iria se manifestar. O advogado se dispôs a voltar a se manifestar nesta sexta-feira, 18.

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