Uma rede de apoio só para mulheres

Jornalista cria grupo que promove ajuda entre desconhecidas após post em rede social viralizar

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Por Roberta Pennafort
Atualização:

RIO - No dia 12 de março, a jornalista baiana Sueide Kintê escreveu descompromissadamente em seu perfil no Facebook: “Se você é mulher e precisa de ajuda em alguma das coisas listadas abaixo, eu faço de graça pra você, menina! Estou disponível uma hora por dia”. Na lista, gentilezas como cuidar de crianças, cozinhar massas, trançar cabelo, ensinar a andar de bicicleta, escrever projetos culturais, “só ouvir”. Passados 50 dias, foram cerca de 15 mil compartilhamentos da ideia na rede social. 

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Mais de 7 mil mulheres já seguiram o exemplo. Batizado de “Mais Amor entre Nós”, o movimento de apoio mútuo entre desconhecidas se espalhou pelo País. Neste mês, deve ganhar aplicativo para celular e tablet.

Do Rio, a administradora de empresas Rafaela Gama ofereceu aula de inglês, auxílio para tirar visto americano e acompanhamento de pacientes em hospitais. De Porto Alegre, a fotógrafa Carla Kneip se dispôs a registrar eventos infantis para quem não tem condições de pagar. A universitária Orquídea Azevedo, de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, tem dado aulas de reforço de redação a mulheres que estão retomando os estudos. A dona de casa Erika Pissara, de Socorro, interior paulista, vem doando seu tempo para melhorar a alimentação de crianças. 

Post da jornalista Sueide, terceira da esquerda para a direita, acabou como exemplo para 7 mil mulheres Foto: Divulgação

A campanha chegou até a Camberra, capital da Austrália, onde mora a designer Julia Harger: ela se prontificou a criar a comunicação visual de iniciativas de mães empreendedoras.

“Escrevi de forma despretensiosa, deitada na cama, e hoje as publicações alcançam 72 mil pessoas diariamente”, conta Sueide, que mora em Salvador e milita contra o machismo e o racismo. Ela recebe cerca de 200 mensagens por dia.

“A palavra sororidade (<em>união entre as mulheres</em>) vem sido muito difundida e tem sua importância semântica na disputa de narrativa. Mas, se as mulheres não exercitassem isso há muito tempo, cuidando do filho uma da outra, por exemplo, não existiríamos mais. A solução vai ter de passar pelas mulheres, já que somos nós as principais vítimas dos problemas sociais no Brasil. A mulher cuida dos outros, mas quem cuida de quem cuida?”, questiona Sueide.

Conectadas. O aplicativo do “Mais Amor entre Nós” conectará mulheres que querem ajudar as outras não só com seus préstimos, mas também com doações. A usuária vai se cadastrar e usar o serviço de busca com palavras-chave. O dia e horário em que vão se encontrar serão combinados individualmente. Carla, a fotógrafa gaúcha, de 41 anos, vai encaixar o trabalho voluntário entre os compromissos pagos. “A proposta é excelente e pode ser estendida a famílias, a pais solteiros. Esse tipo de ajuda não é novidade, a diferença é a internet.”

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As participantes, de diferentes estratos sociais, são estimuladas a escolher atividades que gostam de executar, para que ajudem as outras com prazer.

No rol das ofertas: caronas, dicas para edição de vídeo, aplicação de reiki, auxílio no pós-parto, organização do lar, conselhos sentimentais, consultoria jurídica, serviço de manicure e de faxina, leituras de tese e aperfeiçoamento de currículo. Inclui até companhia para denunciar companheiros violentos, assistência a mulheres com zika ou àquelas que querem “sair do armário” – uma das frases de impacto escolhidas para divulgar a campanha foi: “é aquela velha história de mulher cuidando de mulher”. No site www.maisamorentrenosbrasil.com.br, doações de roupas e livros são anunciadas na seção “Tô Dando, Você Quer?”.

Apoio. A dona de casa Erika, de 26 anos, percebe que algumas mulheres que entram em contato só precisam “de um ombro amigo”. “Assim que vi no Facebook, resolvi participar. Posso ensinar crochê, dar ideias para nomes de blog e lojas. Muita gente achou que era algo ‘fake’, mas é uma corrente feminista do bem”, diz. Orquídea, de 27, ajuda “com o que tem no momento”. “Três mulheres me procuraram porque estão estudando para o Enem. Corrijo textos. Estou desempregada, tenho tempo livre.”

“Tiro uma horinha por dia para isso, cinco vezes por semana, quando minha filha já está dormindo. No segundo dia depois que postei no Facebook, já tinha 200 pedidos de ajuda”, diz Julia, de 30 anos, que cria comunicação visual para empreendedoras. “Como mãe solteira que mora longe da família, fiquei muito emocionada ao saber da campanha, pois sei como as coisas podem ficar difíceis para nós”, afirma.

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