Chuva intensa ficará mais comum e Brasil deve investir em monitorar risco de desastre; leia análise

Especialista diz que são necessárias políticas públicas de moradia e que é preciso reduzir a crise climática

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Por José Marengo
Atualização:

Em uma tragédia como a de Petrópolis, há uma combinação de dois fatores: o excesso de chuvas, que é a parte climática, e a vulnerabilidade e exposição da população. Ou seja, há pessoas morando em áreas de risco, encostas ou perto de córregos canalizados.

Os extremos climáticos têm crescido em quase todo o mundo, com muita chuva concentrada em poucos dias ou poucas horas. As projeções sugerem que isso pode aumentar mais no futuro, com o aquecimento global. Em São Paulo, por exemplo, o número de dias com chuvas acima de 100 mm está crescendo. Nos anos 1960 e 1970, eram mais ou menos quatro e, entre 2000 e 2020, foram 16.

Morro da Oficina, em Petrópolis, após temporal que deixou mais de 50mortos Foto: Wilton Júnior/Estadão

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Se nada for feito para reduzir o risco da população, os desastres também vão aumentar. E isso não depende das pessoas: ninguém mora em uma área de risco porque quer. Políticas públicas de moradia podem reduzir o número de pessoas em risco no futuro.

Em áreas já ocupadas, é preciso, na pior das hipóteses, evacuar e realocar a população. Vai custar caro, mas, se não fizermos isso, mais pessoas vão morrer. Além disso, precisamos de programas de reflorestamento de áreas de mananciais e encostas. E, se já observamos que o fenômeno está associado ao aquecimento global, é preciso reduzir a crise climática.

Paralelamente, também é necessário trabalhar em melhorias na previsão do tempo, no monitoramento de vulnerabilidade e no sistema de comunicação de alertas. Hoje, dos 5 mil municípios brasileiros, o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) monitora 1.038, concentrados em regiões de maior densidade populacional.

São colocados instrumentos para medir chuvas em áreas de risco, umidade do solo, sensores para deslizamentos e movimentos de terra. Mas há municípios que não são monitorados e, para esses, não há como fazer previsões. Se mais áreas fossem acompanhadas, isso poderia ajudar a emitir alertas a todos os que podem ser afetados.

Porém, ainda que tenhamos os melhores modelos hidro-geo-climáticos, a melhor rede observacional de monitoramento climático e hidrogeológico e um grande número de cientistas e tecnologistas, a situação atual de risco de desastres pode não melhorar se nada é feito para reduzir a vulnerabilidade e risco de populações expostas. Isso vai depender de políticas públicas ambientais e de criar na população e nos tomadores de decisões uma percepção de risco de desastres naturais, algo que deve ser incluído no currículo escolar.

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* Climatologista, meteorologista e coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais)

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